quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Quanto a um presente,

Eu alto
Ela, às vezes, pequena
Eu magro
Ela magricela também

Eu digo o preto no branco
E ela: depende
Pode, ou não, ser diferente
Ela me entende

Eu digo: somos grandes filósofos
Que morremos no século passado
Somos o cravo e a rosa
Seremos a terra e o arado

Ela diz: hoje sou o que tenho sido
Desde o ano passado
Amanhã me verei diferente
Estando, ou não, ao teu lado

Eu absoluto
Ela relativa
Eu de luto
Ela hiperativa
Eu resoluto
Ela inspirativa
Eu escorbuto
Ela vitamina

Eu absolutamente relativo
Ela relativamente absoluta
Os dois independentemente ligados
De forma incrivelmente realizável

Taciano S. Zimmermann

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Quanto ao calado,

"[...] E assim, em vez da bela liberdade, da solidão e da música, a triste alma tem mesmo é que se debater nos cuidados, vigiar e amar, e acompanhar medrosa e impotente a loucura geral, o suicídio geral. E adular o público e os amigos e mentir sempre que for preciso e jamais se dedicar a si própria e aos seus desejos secretos. [...]"

Fragmento de Talvez o último desejo, de Rachel de Queiroz

sábado, 4 de setembro de 2010

Quanto a fases,

Lua adversa

Tenho fases, como a lua
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e que vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

E roda a melancolia
seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia.
o outro desapareceu...

Cecília Meireles

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Quanto à formação literária,

Coletânea de frases soltas roubadas

E avança no livro como quem escapa do mundo por um túnel secreto.
Como quem desaba, não como quem acorda. Para fugir do terrível acaso que nos define.

É por si só mais um passo demonstrativo da vida em direção à profunda indiferença de todas as coisas. Essa algaravia monumental em toda parte, todos falando tudo a todo instante, esse horror coletivo ao silêncio.

Todas as pessoas estão no limite, permanentemente no limite de si mesmas.

No bar, a filosofia e a risada, o brinde da cerveja: somos todos reiteráveis!
Ali, era enfim a sensação de um tempo parado, suspenso.

E uma boa sensação de gravidade lhe tomava os gestos ressaqueados de uma espécie de renascimento. Ou de deslocamento definitivo, permanente, inelutável.
Era preciso que a "verdade" saísse da retórica e se transformasse em inquietação permanente, uma breve utopia, um brilho nos olhos. A ideia do sublime não basta, com ela chegamos só ao simulacro.

Naqueles tempo tolerantes, como quem, prosaicamente, apeas perde um privilégio, o da liberdade. Por uma sucessão inextricável de acasos...

Dá meia-volta, pega outra rua, e outra, mas todas não levam a lugar nenhum.

Relaxe; o tempo está escorrendo.

Ponha o pé num avião, ele concluiu - e desaparecemos.
E desapareceu por onde veio.

Vire-se. É a sua vez de jogar.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Quanto a um conto,

A Princesa Hindu

"Me pega", a menina de súbito dizia, tentando surpreender o companheiro, e pulava do alto da escada que um pau mantinha erguida sob a supervisão do menino. Este, fingindo-se tomado pelo susto, de pronto agarrava-a ainda no ar, logo que ela se deixasse desprender do último degrau, e rindo colocava-a no chão. E assim podiam passar horas e horas do dia, entretendo-se com o que tinham. Era pouco ou quase nada. Filhos da terra, não possuíam brinquedos, somente tinham a imaginação e a companhia um do outro.
Criaram-se juntos, filhos de pais compadres, vizinhos na roça. Ela era a mentora das brincadeiras, estava sempre certa, mandava e desmandava. O menino obedecia, era seu cúmplice fiel e zeloso a acompanhava aonde fosse. "Eu sou a princesa e você é meu servo", ela dizia. Juntos criaram um reino hindu, onde os cavalos viravam elefantes, os casebres viravam palácios e o riacho era, na verdade, lágrimas vertidas de uma deusa virgem. Nesse reino nada faltava.
No entanto, a realidade era outra. Era tempo de seca e a comida já começava a rarear. As duas crianças, sob o sol forte, eram agora exploradores do deserto. A menina, empunhando uma sombrinha, dizia ser a chefe da missão. "Mas você já é a princesa", o menino protestou. "Por isso mesmo", ela retrucava e continuava com a cena, "agora eu digo que temos que subir aquelas dunas, pode ser que encontremos água". Subiu a escada, com sombrinha e tudo. O menino tentava acompanhá-la com o olhar, seu estômago doía raso e, ao olhar em direção a ela, o sol ofuscava-lhe a visão. Os olhos ardiam como se queimassem. "Me pega", ela disse, e confiante no companheiro pulou.
Caída no chão, imóvel e inconsciente, a menina ainda respirava. Quanto a ele, a cor fugiu da face, o coração subiu à boca, não ousava respirar. Correu, em pânico, buscando por ajuda. Atravessou o riacho das lágrimas vertidas, montou no seu elefante, buscou socorro no palácio. Mas todos estavam na roça e não ouviram as suas súplicas. Enquanto isso, a princesa hindu já ia ao encontro dos seus. Foi para o seu reino hindu, onde sua tribo a esperava. Lá onde agora somente uma coisa faltava: a companhia do seu fiel servo.
Thatiane C. Pires

domingo, 28 de março de 2010

Quanto a um conto,

Entre súplicas mal disfarçadas, ela aguardava a sua vez desejando, porém, que nunca chegasse. Se lhe perguntassem o que ela estava esperando, diria: a morte. E falaria isso com ares de veterana, cujo corpo já sentira outras duas vezes o fim da vida e que, sem escrúpulos, ousava continuar vivendo. Desta vez, no entanto, seus olhos traíram-na. Seus antigos cúmplices agora revelavam medo, reflexo do que ela no íntimo sentia. Um sentimento de impotência diante da situação que vivia.
A sala de espera ainda era a mesma e a garota se via sentada no mesmo estofado de mau gosto azul marinho com flores amarelas. Na porta do estabelecimento não havia qualquer identificação. Todas as que ali entravam o faziam sem anunciar, sequer encaravam as outras da sala ou levantavam os olhos. A música ambiente não bastava para dissimular o clima tenso e mal disfarçava os gemidos e às vezes gritos vindos lá de dentro.
Era a terceira vez que a garota recorria aos serviços da Vó Lélia, dona do lugar. O primeiro aborto, aos 12 anos, fora um procedimento tranquilo, incomum para a idade, o que de certa forma a deixou confiante, a ponto de não hesitar ao tirar a segunda gravidez, aos 15 anos. Não podia ignorar, porém, o quanto a morte pesava dentro de si e como o tempo morria em sua vida. Seus 17 anos tinham agora cheiro de 30, de tão repletos que estavam de problemas.
"Você", Vó Lélia disse apontando a garota. Entraram no outro cômodo, aquele de onde os gemidos vinham. A senhora reconheceu a pequena. "Faz o que... dois anos?", Vó Lélia perguntou e a garota fez que sim. Depois, com má vontade, a velha indagou se era necessário repetir as instruções quanto ao procedimento. "Por favor", disse a garota nervosa, instruções nunca eram demais, aprendera isso da pior maneira. "Fique tranquila, não há nada novo para você", a mais velha acrescentou ao ver a já rara cor sumir por completo da face da coitada.
Por que estava fazendo isso? Procurou argumentos, mas nenhum lhe pareceu suficiente no momento. Iam começar a intervenção, a menina pôs-se a gritar. E podia jurar que junto ao seu grito de medo e de dor berrava o seu ventre. Viu-se incapaz de tomar qualquer decisão, um sentimento já bem conhecido por ela: a mesma impotência que a impedia de mandar na própria vida. Desistiu. Ainda era tempo, seu ventre estava intacto. Pela primeira vez, iria sentir a vida. Iria nascer do próprio parto.
Thatiane C. Pires

sábado, 13 de março de 2010

Quanto ao sentimento,

"[...] Mas sentimentos são a água de um instante. [...]"

Clarice Lispector, em A Legião Estrangeira

Quanto a um conto,

O Violoncelo

Era uma vez um violoncelo capaz de encantar aos ouvidos mais refinados e de despertar amores tão profundos a ponto de adoecerem aqueles não correspondidos. O tempo só havia aprimorado seu som doce, porém brilhante, e, ainda que as viagens e as mudanças houvessem provocado alguns arranhões, o campo harmônico de espruce, combinado ao salgueiro internamente e o bordo ao fundo e no braço, formava uma robusta e inexorável caixa acústica.
O instrumento estava na família Bettoni há quatro gerações. Havia resistido à imigração da família italiana de Mantova para Santa Catarina, em 1878, para a alegria dos descendentes Bettoni - entre eles, Giacomo, filho de Giovanni e Antonia. Sendo o único homem de uma prole de seis, o caçula herdara o violoncelo e, conforme a tradição da família, aprendera com o pai a manipular o instrumento que, em parte, era responsável pela configuração genealógica da família, sendo determinante na união matrimonial dos diversos "nonnos" e "nonnas".
Era uma tarde de domingo, o tio solteiro Giacomo estava sentado na sala do casarão da família, os sobrinhos a seus pés brincavam e desenhavam, quando a carta anônima chegou. Era oferecida uma enorme quantia pelo estimado violoncelo da família, o que o deixara intrigado. Tentado pelo valor em moedas citado, mesmo sem intenção de venda, a curiosidade fez com que escrevesse para o anônimo, convidando-o a avaliar o violoncelo assim que lhe fosse possível.
No dia seguinte, logo pela manhã fez-se a visita. Maior ainda foi o espanto de Giacomo ao averiguar que o anônimo era, na verdade, uma compradora. A mulher solteira se apresentou como Beatrice Vitti, devia ter 25 anos e parecia de uma tristeza intrínseca, daquelas que configuram um encanto próprio a quem a possui. O caçula Bettoni, surpreso com a inabilidade da moça ao segurar o violoncelo, encheu a pobre de perguntas sobre a finalidade de tal aquisição. "Vou destrui-lo", disse amargurada.
"Este instrumento matou minha mãe de tristeza e arruinou minha vida antes mesmo de eu nascer. Sou fruto de um casamento sem amor que levou minha mãe Catterina Rivellini ao suicídio. Postumamente, encontrei seus escritos que aludiam a Giovanni Bettoni, teu pai, e ao violoncelo encantado, aos quais minha mãe fora amante profunda e fiel. Iludida e não-correspondida, Catterina se ausentou ainda em vida - e eu só conheci sua ausência."
Atordoado com o emocionado testemunho, Giacomo começa a tocar, com uma compaixão determinada, uma das suites de Bach para violoncelo, e a filha renegada de pronto se encanta com tão virtuoso som. Era o consolo que sempre procurara e pelo qual ansiava todos os dias. Giacomo e Beatrice fitavam-se ardentemente com os olhos e, como nunca, desejavam alguém. Pela primeira vez Beatrice compreendeu sua mãe. Estava selada a configuração futura de mais uma geração Bettoni.
Thatiane C. Pires

sábado, 6 de março de 2010

Quanto a Ele,


Quanto à sabedoria,

"A sabedoria nos chega quando já não serve para nada."

(Extraído do livro O Amor nos Tempos do Cólera, de Gabriel García Márquez)

Quanto à perturbação,

"A arte é feita para perturbar; a ciência tranquilizar."
Georges Braque

Nota: Adoro ser perturbada nesse sentido! Sem perturbação, o oceano seria mera poça d'água parada em muda agonia!

Quanto à madrugada,

O prazer da solidão de uma madrugada proibida:
todos já exploram o inimaginável subconsciente,
enquanto o infrator,
sob o luar alvo e insuficiente,
escreve poemas de amor.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Quanto a notas,

Nota sobre a necessidade mnemônica:

Tal necessidade difilcimente será lembrada ou sequer notada e, consequentemente, sanada.

Quanto à efemeridade,

Ah, o esplendor efêmero daquela tarde a menos, já partindo para nunca mais!

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Quanto ao coração,

Poema 12

Para mi corazón basta tu pecho,
para tu libertad bastan mis alas.
Desde mi boca llegará hasta el cielo
lo que estaba dormido sobre tu alma.

Es en ti la ilusión de cada día.
Llegas como el rocío a las corolas.
Socavas el horizonte con tu ausencia.
Eternamente en fuga como la ola.

He dicho que cantabas en el viento
como los pinos e como los mástiles.
Como ellos eres alta y taciturna.
Y entristeces de pronto, como un viaje.

Acogedora como un viejo camino.
Te pueblan ecos y voces nostálgicas.
Yo desperté y a veces emigran y huyen
pájaros que dormían en tu alma.


Veinte poemas de amor y una canción desesperada, Pablo Neruda

Quanto ao inevitável,

"Era inevitável: o cheiro das amêndoas amargas lhe lembrava sempre o destino dos amores contrariados."

O Amor nos Tempos do Cólera, Gabriel García Márquez

Quanto ao meu mistério,

"E me faz sorrir no meu mistério. O meu mistério é que eu ser apenas um meio, e não um fim, tem-me dado a mais maliciosa das liberdades: não sou boba e aproveito."

O Ovo e a Galinha, Clarice Lispector

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Quanto a composições,



"We've just passt under the river,
I felt like a lot of water on my head.
'Cause when we're under the river
You better hold your breath!
Take a good look outside the car
and tell me
Where we are
'Cause I don't know any place down here.
There are so many things to find,
We're gonna stay here all night,
So, let the water take your mind,
heart, soul."
(Under the river - Composição Taciano S. Zimmermann e Thatiane C. Pires)

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Quanto à sorte,


"(...) Boy I hear you in my dreams,
I feel ou whisper across the sea;
I keep you with me in my heart,
You make it easier when life gets hard.


Lucky I'm in love with my best friend,
Lucky to have been where I have been,
Lucky to be coming home again..."